Skip links

Fiocruz anuncia primeira vacina contra a Esquistossomose e a distribuição no SUS até 2025

O Brasil tem uma média de 472 mortes anuais, ganhando protagonismo na produção mundial da vacina humanitária que também será usada em regiões endêmicas de países africanos.

Paulo Domingos

Clique para ouvir esta reportagem.

A Vacina Schistovac contra o vírus da doença esquistossomose estará pronta  em poucos meses pela Fundação Oswaldo Cruz ( Fiocruz) e deverá ser distribuída para o Sistema Único de Saúde (SUS) até o final de 2025. 

A vacina é um projeto que já vem sendo estudado através de testes clínicos e se tornará a primeira vacina do mundo contra a doença segundo a pesquisadora Miriam Tendler da Fiocruz.  

As primeiras fases da vacina foram realizadas no Brasil em regiões não endêmicas, passando pelo processo regulatório da Anvisa (Agência nacional de Vigilância Sanitária), depois passou por uma área endêmica em Senegal com o apoio do Instituto Pasteur de Lille, na França onde foram testados em adultos e em crianças. 

 A vacina será patenteada pelo IOC (Fiocruz) que é responsável pelo completo comando da fase final e também pela produção da vacina.   “O Brasil [ganha] destaque como fornecedor de tecnologia de ponta e inverte o paradigma de a gente estar comprando do Hemisfério Norte ou da Ásia, como foi o caso da Covid-19. A gente vai se capacitar através de Bio-Manguinhos” disse a pesquisadora. 

 A produção e comercialização da vacina têm critérios muito restritos dentro de padrões de uma vacina humanitária estabelecida pela Organização das Nações Unidas (ONU) A Fiocruz distribuirá a vacina “no contexto de uma vacina humanitária (…) e, isso tem uma grande importância” alertou Tedler. 

Além disso, o escritório diplomático brasileiro em Genebra, chamado Missão Permanente do Brasil junto à ONU está apoiando a Fiocruz para financiamento que permite um fundo para o fornecimento da Schistovac como uma vacina humanitária que pode ser usada dentro de um calendário de imunização em países africanos em situação endêmica da doença. 

Foto: Paulo Domingos –  Grande São Paulo – Moradias precárias próximo a córrego de esgoto e risco ao contágio de diversas doenças.

Estudos já previam a Vacina 

Um artigo publicado pela Agencia Brasil em 2021 onde os pesquisadores Sergio Verjovski-Almeida e Murilo Sena Amaral do laboratório de Parasitologia do Instituto Butantan em São Paulo ensaiava o desenvolvimento de uma vacina para o combate do vírus que provoca a doença esquistossomose. 

Foram feitos experimentos ao infectar macacos da espécie rhesus e observaram uma possível memória em uma segunda reinfecção. O resultado foi positivo, todos se curaram entre 12ª à 17ª semana. 

 “ A Conclusão foi que os macacos se recuperavam ainda mais rápido da reinfecção. De fato, após o segundo contato com a doença, os rheus não apresentaram sintomas clínicos” divulgou o Instituto Butantan.

  A Próxima fase seria a identificação das proteínas do parasita que são atingidas pelos anticorpos dos macacos e o teste destas proteínas em camundongos infectados. 

 A Organização Mundial de Saúde (OMS) até então recomendava o medicamento Praziquantel, que é ineficaz para eliminar os parasitas mais jovens e também não previne a reinfecção. 


Como ocorre a transmissão

Quando uma pessoa é o hospedeiro e defeca próximo a um rio ou córrego, os ovos eclodem, liberam as larvas e infectam os caramujos que vivem em águas. Depois de quatro semanas as larvas se dissociam dos caramujos e se espalham pela água exposta. Esta água se torna um vetor de contaminação para qualquer pessoa que tiver contato.  Os primeiros sintomas aparecem em torno de seis semanas.  Um paciente infectado não transmite para outro.  

Qualquer região carente que falta saneamento básico, sem acesso a água potável corre o risco de ter esse tipo de contaminação.  São milhares de comunidades no Brasil que sofrem com a falta de saneamento básico expondo milhares de pessoas às mais diversas doenças relacionadas às geo-helmintíases*, inclusive, a esquistossomose. 

*Geo-Helmintiases  é um grupo de doenças parasitárias intestinais causadas pelos parasitos Ascaris lumbricoides, Trichuris trichiura e pelos ancilostomídeos: Ancylostoma duodenale e Necator americanus. Na fase inicial, o paciente pode apresentar: Febre, Suor, Fraqueza,  Palidez, Náuseas e Tosse. Após o surgimento das formas adultas no intestino, podem ocorrer: Desconforto abdominal, Cólicas intermitentes,  Perda de apetite, Diarreia, Dores musculares e Anemia de diversos graus.  FONTE: Ministério da Saúde. 

O áscaris Lumbricóides e o Trichuris Trichiura podem ser transmitidos pela falta de higiene, por manuseio de alimentos mal lavados, como hortaliças, frutas e legumes, pelo uso de instalações sanitárias precárias e pela água não tratada. 

Tratamento 

Após a infecção ser diagnosticada, baseada na observação microscópica dos ovos nas fezes, o médico poderá prescrever Albendazol ou outro helmíntico para o tratamento das geo-helmintíases. 

Imagem: WIKIPÉDIA 

Sintomas 

Numa primeira fase após a contaminação o paciente pode não apresentar nenhum sintoma. No decorrer da evolução do quadro pode apresentar febre, dor de cabeça, calafrios, suores, fraqueza, falta de apetite, dor muscular, tosse e diarreia. Quando crônica, a diarreia se torna mais frequente, com prisão de ventre, podendo aparecer sangue nas fezes. 

Em casos mais graves, do paciente pode emagrecer muito, sentir muita fraqueza e aumento do volume do abdômen que podem levar a internações e óbitos. 

É preciso a prevenção e a educação higiênica evitar o contato com águas onde já tenha sido detectado caramujo infectado e o esclarecimento sobre higiene básica como lavar bem as mãos antes das refeições e após ir ao banheiro, consumir água filtrada ou fervida, lavar bem os alimentos e não evacuar água de esgoto próximos a rios, lagos e açudes

A posição do Brasil no Mundo 

Mesmo diante de um trágico problema social, o Brasil ainda está em uma posição melhor se comparado a outros 48 países incluindo a Índia quando o assunto é Saneamento Básico. 

Para o professor e relator Especial do Direito Humano à Água e ao Esgoto Sanitário das Nações Unidas (ONU), Léo Heller,  em muitos lugares na Índia, populações não têm banheiros instalados em casa, e defecam a céu aberto.  “ Pior do que a [situação] do Brasil em muitos lugares, a população defeca a céu aberto, uma vez que as casas não têm banheiro (…) Isso para esquistossomose é um risco muito grande (48 países de baixo desenvolvimento econômico mostram a pior situação; a maioria está na África Subsaariana e, na América Latina, o destaque negativo é o Haiti. Mesmo nas áreas urbanas, o acesso à água e esgoto é muito baixo. “ Alerta o Professor. 

Políticas Públicas 

De acordo com o Inquérito Nacional de Prevalência da Esquistossomose Mansoni e Geo-Helmitíases realizado entre 2010 a 2015 foram detectados nas regiões periféricas urbanas e nas Regiões Norte e Nordeste mais de 5.192 casos de Ancilostomíses; 11.531 de Ascaríases e 10.654 de tricuríase. Em Alagoas, Bahia, Pernambuco, Rio Grande do Norte, Paraíba, Sergipe, Espirito Santo, Maranhão e Minas Gerais entre janeiro de 2010 e outubro de 2022 foram realizados 10,7 milhões de exames e detectado mais de 410.654 casos do vírus da Esquistossomose. Foram feitas 2.389 internações e 6.130 óbitos, representando uma média de 472 mortes por ano. 

As classes populares que estão marginalizadas de políticas públicas e vivem em condições precárias de moradias estão entre as mais vulneráveis à contaminação da esquistossomose e as geo-helmintíases, pela falta de conhecimento sobre a doença, falta de prevenção, acúmulo de resíduos sólidos em terrenos baldios e falta de água potável.

Os problemas que envolve moradias precárias afetam mais de 800 milhões no mundo e colocam essas pessoas expostas a doenças como a esquistossomose, com mais de 300 milhões infectados pelo vírus.  Tendler alerta para o avanço do contágio da doença na região Sul e Sudeste do Brasil. “ É uma doença que está em expansão (…) também conhecida como barriga d’água. A esquistossomose é ligada a baixas condições sanitárias e à falta de saneamento básico é uma questão humana inquestionável” completou a pesquisadora. 

Segundo o portal do Ministério da Saúde, nove ministérios elaboraram um projeto estratégico para intensificar a erradicação destas doenças nas comunidades mais carentes e vulneráveis, formando o Comitê interministerial ´para Eliminação da Tuberculose e Outras Doenças Determinadas Socialmente ( CIEDS),  para a Ministra da saúde Nísia Trindade, esse comitê é uma causa em que todas as pastas do governo devem colaborar para reduzir a desigualdade social: “Não é possível pensar o Ministério da Saúde sem abrir essa grande angular, para que nela possa caber um país com tantas desigualdades, mas também com tantas potências, como é o Brasil. Por isso estamos todos juntos. Essa agenda significa a possibilidade de eliminar doenças como problema de saúde pública, algumas, inclusive, históricas. Esse comitê busca reduzir as desigualdades, para que tenhamos, efetivamente, saúde para todos”, comentou a Ministra.