
Nikolas Ferreira: O Político Influencer e o Poder da Desinformação
Saulo Santos
O ano de 2025 não começou da melhor forma para o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A sua equipe sofreu uma grande derrota aos olhos do público ao ter que voltar atrás e revogar o ato que ampliava a fiscalização sobre transações financeiras, incluindo o PIX.
A decisão veio depois de uma generalizada insatisfação popular com a medida que destacou um dos grandes gargalos do atual governo que é a comunicação nos tempos de redes sociais. Isso porque o que gerou todo o descontentamento não foi o ato em si, mas sim aquilo que circulou a respeito dele graças às infames fake news, um dos maiores desafios que democracias ao redor do mundo vêm tentando superar.
O que temos de factual nessa história? A Receita Federal iria atualizar regras para monitoramento de transações financeiras. Segundo consta, essa medida tinha como objetivo impedir fraudes e sonegação fiscal. Com a atualização, haveria um monitoramento de movimentações acima de R$ 5 mil por mês, no caso de pessoas físicas, e R$ 15 mil mensais, no caso de pessoas jurídicas. Monitoramento este que já acontece para valores que excedem em R$ 2 mil para pessoa física e R$ 6 mil no caso de pessoa jurídica.
Porém, logo após o anúncio dessas novas regras, o que passou a circular pelas redes sociais foi uma outra narrativa, a de que o governo iria passar a taxar o PIX. Lançado oficialmente no final de 2020, o PIX hoje é a principal ferramenta de transferência monetária instantânea e de pagamento eletrônico instantâneo no país. Uma grande parcela da força de trabalho do Brasil é composta por trabalhadores informais que dependem do PIX para receber o pagamento pelos seus serviços. O mesmo se aplica aos pequenos negócios, de vendedores ambulantes até lojas de varejo, que utilizam a ferramenta tanto com seus clientes quanto com seus funcionários.
Ainda que nesse espaço exista sim muita sonegação, o que preocupou a população brasileira foi a possibilidade de perder parte da sua renda num país em que o mínimo de estabilidade financeira é um luxo para poucos. Logo, é compreensível como uma notícia falsa foi capaz de mobilizar tantas pessoas contra a medida do governo.
A Estratégia fraudulenta de Nikolas nas Redes
Apesar do esforço de jornalistas e outros agentes que atuam nas discussões políticas, sobretudo em plataformas digitais, a narrativa da “taxa do PIX” continuou ganhando repercussão. Mas o golpe mais forte veio na forma de um vídeo publicado pelo deputado Nikolas Ferreira nas suas próprias redes sociais.
Nas eleições de 2022, Nikolas Ferreira foi o deputado federal mais votado do país, se elegendo pelo Partido Liberal (PL). Nikolas também teve uma votação expressiva nas eleições municipais de 2020, onde ele se elegeu como vereador de Belo Horizonte, também pelo PL. Mas antes de iniciar sua carreira política, Nikolas foi uma das principais vozes da militância bolsonarista que se solidificou com a eleição do agora ex-presidente – e inelegível – Jair Messias Bolsonaro.
Em seu vídeo, que acumulou mais de 300 milhões de visualizações no Instagram desde quando foi ao ar, Nikolas critica a medida do governo. Mas há uma particularidade na fala do deputado. Quem conhece sua atuação nas redes poderia esperar que ele viria com a narrativa da “taxa do PIX”, porém, ao contrário, ele diz que o mecanismo não será taxado. Mesmo assim, o Nikolas se aproveita do medo que essa fake news gerou. Se valendo do caso da “taxa das blusinhas da Shein”, uma medida do governo que de fato ocorreu, o deputado diz que essa possibilidade de uma taxação no PIX poderia acontecer no futuro. Essa é a chave do seu discurso.
Nikolas Ferreira faz parte de uma nova geração da classe política, o “político influencer”. Nessa classe o mais importante não é sua atuação dentro da Câmara, mas sim a sua atuação nas redes sociais. Nikolas é jovem, nem mesmo chegou aos 30 anos, porém entende muito bem como as dinâmicas das plataformas digitais funcionam. O seu discurso é repleto da demagogia que repercute muito bem nessas redes e que consegue conquistar um eleitorado que perdeu a fé no sistema político.
Isso não significa que o deputado não tenha sua ideologia, mas sim que a forma como ele age não é em prol desses ideais e sim apenas para viralizar nas redes que é onde Nikolas consegue seus eleitores. Basta olhar sua carreira como vereador e deputado.
Transfóbico e negacionista
Um dos “grandes momentos” de Nikolas foi um protesto transfóbico no Dia Internacional das Mulheres, em 2023, no qual ele subiu na tribuna da Câmara dos Deputados com uma peruca loira, se apresentando como Nicole e dizendo que “as mulheres estão perdendo seu espaço para homens que se sentem mulheres”. Como política pública o ato do deputado não gerou qualquer impacto, contudo repercutiu bastante nas redes bolsonaristas e outros veículos de extrema-direita.
Até mesmo as fake news que Nikolas decide compartilhadas são escolhidas a dedo para ter o melhor resultado com a sua base. Em 2020 o até então vereador publicou um vídeo que dizia que a máscara era ineficiente contra a COVID-19. Dois anos depois ele usou suas redes para divulgar informações falsas sobre a urna eletrônica para criar mais desconfiança com as eleições.
População enganada
E infelizmente esse tipo de discurso funciona porque existe uma boa parcela da população descrente ou revoltada tanto com a classe quanto com o sistema político. Assim eles veem em figuras como Nikolas Ferreira um caminho para renovação, hipnotizadas pelas suas falas construídas para explorar seus medos ou confirmar suas visões de mundo. Elas não percebem que estão sendo usadas por demagogos que querem apenas garantir votos na próxima eleição.
Quando Nikolas fala do metafórico trabalhador no seu vídeo, ele fala com o mesmo cinismo que Bolsonaro usava ao falar de democracia. O deputado não tem e nunca teve os interesses do trabalhador como sua plataforma política. Não é à toa que ele se opôs ao movimento pelo fim da escala de trabalho 6×1, ao ponto de usar ChatGPT para criar “argumentos” em favor dessa escala.
Ele vai para redes para compartilhar desinformação, para compartilhar discursos discriminatórios, para espalhar qualquer pânico moral que seja benéfico para que ele consiga manter seu eleitorado preso num mundinho de fantasia das fake news. Nikolas não se importa com o povo, Nikolas não liga para o povo. Bom, a não ser que estejamos em ano eleitoral.