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Revisada por crianças: Pesquisa do Butantan sobre veneno de peixe que pode virar remédio

Proteína do veneno de um peixe brasileiro pode ter potencial contra doenças inflamatórias.

Philipe Campos

Parece história de filmes, que pesquisa do Butantan foi revisada por crianças. Mas não é uma história, aconteceu de fato que um grupo de pesquisadores do Instituto Butantan, em São Paulo, publicou um artigo na Frontiers for Young Minds, uma revista científica revisada e editada apenas por crianças. Segundo os autores, trocas de ideias com o público infantil ajudam a aproximar a sociedade de conceitos complexos.

Os especialistas brasileiros investigam venenos de peixes peçonhentos, avaliando uma molécula chamada TnP que tem potencial de virar no futuro, um tratamento contra doenças inflamatórias como asma, esclerose múltipla entre outras.

O centro de pesquisas possui há algumas décadas um grupo que estuda especificamente os venenos de peixes. É o caso, por exemplo, de alguns bagres, das arraias, do niquim e do peixe zebra que são os focos de pesquisa no Butantan.

Ao fazer análises sobre o veneno que é inoculado pelo niquim, os especialistas do Butantan identificaram a tal molécula chamada TnP. Eles sintetizaram quimicamente essa molécula e começaram a fazer os primeiros testes em laboratório. Em roedores, a substância foi capaz de tratar quadros inflamatórios parecidos com asma e esclerose múltipla (uma doença que afeta o sistema nervoso central).

 O TnP sintetizado em laboratório também foi testado no peixe zebra (zebrafish em inglês) e, nesses experimentos iniciais, mostrou-se seguro ao não causar efeitos colaterais dignos de nota.

A pesquisadora Mônica com os peixes da plataforma Zebrafish, essencial para a condução dos estudos com o peixe niquim – Foto Renato Rodrigues – Comunicação Butantan

Interação com as crianças

Segundo os cientistas envolvidos no projeto, interagir com as crianças ajudou a simplificar conceitos e reforçou a importância do trabalho que eles fazem na bancada do laboratório.

No caso da revista Frontiers for Young Minds, porém, o artigo é revisado por crianças de escolas americanas que, com auxílio de professores, apontam as principais dúvidas e pontos que precisam ser reformulados.

Os cientistas-autores da pesquisa e os revisores mirins têm reuniões e conversas, justamente para que o texto final fique o mais claro e detalhado possível — afinal, a ideia é que todo mundo, especialista ou não, possa entender aquilo que está escrito.

O grupo do Butantan, por exemplo, relata que recebeu sugestões das crianças, como incluir algumas ilustrações sobre a anatomia do niquim e as etapas de desenvolvimento do zebrafish (peixe usado na pesquisa), detalhar melhor algumas descrições e acrescentar um glossário de palavras mais complicadas ao final do artigo.

O instituto já possui várias iniciativas de divulgação científica e eles inclusive levam os mais jovens para conhecer o laboratório, mas a publicação da pesquisa numa revista revisada por crianças foi uma experiência diferente.

O grande desafio como cientistas é conseguir demonstrar a grandiosidade desse trabalho de modo que todas as pessoas possam entender. E quando os pesquisadores saem de suas zonas de conforto e conversam com o público, podem até aprimorar o próprio trabalho e encontrar respostas para algumas perguntas.

As investigações com a molécula devem seguir adiante no laboratório. Se os resultados continuarem positivos, é possível que daqui a alguns anos ela seja testada em seres humanos com o objetivo de virar um potencial remédio contra as doenças inflamatórias.

Fontes: Globo Ciência / BBC